quinta-feira, julho 8

A Viagem de Sophia

Aos 84 anos, no dia 2 de Julho de 2004, Sophia de Mello Breyner Andresen deixou-nos sozinhos neste paraíso triste. Normal será faltarem-nos as palavras para homenagearmos uma das maiores poetas contemporâneas portuguesas, prémio Camões de Literatura em 1999.
Hoje, depois da sua morte, pensar em Sophia será sempre ver o mar, muito azul. E é à beira desse mar que os seus versos nos ensinam a viver a poesia, essa respiração primordial de quem ama deslumbradamente o mar e o próprio mistério de haver coisas. É acima de tudo a claridade, o fascínio do real, a inteireza cívica e humana que Sophia nos deixa, comprometendo-se e comprometendo-nos com a beleza do mundo.
A sua obra basta ser apresentada como «Poesia», tal como ela chamou ao seu primeiro livro em 1944. Porque cada palavra serve em primeiro lugar para nomear as coisas, "o mundo deste mundo dito por ele próprio".

'Quando o meu corpo apodrecer e eu for morta
Continuará o jardim, o céu e o mar,
E como hoje igualmente hão-de bailar
As quatro estações à minha porta.

Outros em Abril passarão no pomar
Em que eu tantas vezes passei,
Haverá longos poentes sobre o mar,
Outros amarão as coisas que eu amei.

Será o mesmo brilho a mesma festa,
Será o mesmo jardim à minha porta.
E os cabelos doirados da floresta,
Como se eu não estivesse morta.'
(in Dia do Mar)

E é como se cada palavra, com toda a sua intensidade e rigor em nós se inscrevesse e Sophia apenas se tivesse ausentado dessa "casa branca em frente ao mar enorme". Porque essa é a capacidade máxima de um poeta: fazer-nos ver o mundo como se fosse pela primeira vez.




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