terça-feira, julho 6

E depois do adeus ...


Quarto com vista sobre o País - english spoken!



Notas do Euro

Há muitos anos fui ver um empolgante “derby” regional com o meu avô Manel. No pelado da Atalaia do Campo, a equipa local recebia os encarniçados felpudos dos Escalos de Cima. A meio do segundo tempo os Escalos marcaram um golo contra-maré. O centro-campista Camolas, antiga glória do Benfica já a gozar os doces sabores da reforma aos 40 anos e que pesava perto de 120 quilos, rematou do meio da rua e fez golo, para delírio da claque dos Escalos. Nisto, um velho de bóina a preceito salta para o pelado e corre a abraçar-se ao obeso Camolas. Acenava uma nota de 500 escudos (que na altura era dinheiro) e deu-a ali ao Camolas que ria a bandeiras despregadas com a efusiva gratificação do Ti Manel.
É a minha mais antiga recordação de futebol, o jogo que é objecto dedicado da minha adulação e veneração desde que me conheço.
Agora, depois de ter estado a sofrer de bico fechado, apetece-me no rescaldo do Euro 2004, dar umas notas de euro, armado em Prof. Martelo.

............500 euros...................


Ricardo Carvalho
Não só o melhor defesa do torneio, foi o melhor jogador de todos os que se exibiram ao mais alto nível (talvez dividindo os louros com Maniche “Machin”).
Aquela cara de menino tímido e sorridente esconde um autêntico “imperador”. O herdeiro espiritual de Benckenbauer, provavelmente o melhor defesa de todos os tempos.
Ricardo Carvalho alia um notável sentido posicional a uma capacidade de leitura do jogo e de antecipação, que faz dele o mais evoluído defesa-central da actualidade e um autêntico regalo para a vista de todos aqueles que como eu, apreciam as subtilezas e a importância do trabalho de jogadores normalmente discretos, como os defesas ou os trincos.
Brilhante e inesquecível, merecia que aquele remate contra a Grécia tivesse tido a sorte que no fim nos virou as costas. O Real Madrid tem um novo galáctico a caminho, mas desta vez é um defesa, e que bem precisa.

Adivinhem de quem é esta perna longa e tremendamente eficaz?




Comentários de Mourinho na TVI
Durante três semanas andou toda a gente a discutir o 4+3+3 ou o 4+4+2 como se fossem o Cruwyf. A enxurrada mediática, nas televisões com manadas de comentadores e os jornais desportivos com tiragens astronómicas, acabou por massificar a informação e o comentário “puro e duro”.
Eu que sempre fui um fanático das crónicas de Jorge Valdano e do Cruwyf em anteriores Mundias e Europeus, senti-me literalmente esmagado pela absurda mediocridade geral. Nos comentários do jogo Portugal-Espanha, José Mourinho, convidado da TVI deu um autêntico recital de análise e comentário de um jogo de futebol, e desmascarou a corja de “pseudo-especialistas” e de intrujas, regiamente pagos para dizerem o óbvio. Escutar Mourinho, foi o mesmo que estar sentado ao lado no banco daquele que é o melhor treinador do mundo. Percebemos todos que desenhar futebol não é tarefa para pedreiros, mas sim para grandes arquitectos. Recordo só a forma como Mourinho disse que se devia ventilar o resultado do Grécia-Rússia aos jogadores espanhóis, por forma a amansar a “fúria”. Indicação que pelos vistos o Jorge Andrade cumpriu. Pode ser apenas uma manha, mas revela que o futebol é muito mais do que as boçalidades do Gabriel Alves, do Paulo Catarro, que disseram coisas do género: “Os gregos não ganham aos franceses nem que a vaca tussa”, ou “É mais dificil a Grécia passar a primeira fase do que um camelo passar pelo burco da agulha.” Quanto a espécies bovinas e camelos estamos conversados, estas e outras fraudes foram finalmente desmascaradas.
Nota honrosa ainda para os comentários de António Tadeia e as suas crónicas no “Record” a mostrar porque é actualmente o melhor jornalista da especialidade em Portugal, e por fim, para um surpreendente Duarte Moral, que no “DN” deu 10-0 ao Público em matéria de versatilidade e crónica de futebol.
A velha “Bola” mostrou que está a precisar de fazer uma limpeza de balneário, encostando alguns monstros sagrados como Santos Neves ou Vitor Serpa a um papel meramente senatorial, abrindo as portas à renovação e a uma nova geração de comentadores e jornalistas.
Também no jornalismo há uma altura certa para pendurar as chuteiras. A da “gerontocracia” da Bola já chegou. Por fim o Paulo Sousa ... triste figura mediática para um dos melhores futebolistas da sua geração.

Ó Mister Mourinho, olha eu a dirigir a orquestra.




Luiz Filipe Scolari
O Felipão conquistou a selecção e um País. Humor, afectividade, emoção e o carisma para alimentar um sonho que todos julgavam impossível, até ao último minuto do Euro. O “seu” Scolari é de longe o melhor seleccionador que já tivemos desde o Otto Glória, e pode ter marcado uma viragem decisiva na mentalidade do futebol português, fez-nos a todos acreditar e mudou a trágica mentalidade comezinha das vitórias morais e das fatalidades. Perdemos o Europeu mas ganhámos um novo rumo para a história do futebol português.
Percebe-se porque é que o sr. Pinto da Costa teve de meter a viola no saco e andar caladinho que nem um rato.
A ver se é desta que o futebol português muda de mentalidades e de protagonistas. Eu acredito ... mas com moderação.

Se te portares bem dou-te a minha gravata, não vou precisar dela no sítio para onde vou!




República Checa
Foi claramente a melhor equipa do Euro 2004, e que grande pena a final não ter sido com esta orquestra de solistas, com o fantástico Nedved, o imparável Poborsky, o viperino Baros e o colossal Kholler a oferecerem-nos alguns dos melhores momentos de todo o Euro. Violinos afinados para uma sinfonia de movimentação de bola, pautada pela batuta de Nedved, o número 10 perfeito no transporte e na precisão dos passes. Futebol ofensivo, positivo e alegre que tombou aos pés do cinismo grego.
Se Portugal merecia vencer o Euro pela alma, pela entrega e pela capacidade de sofrimento, a República Checa merecia-o pela arte de jogar bom futebol.

-Olha aí o mau hálito ó Koller!
- Gedelhudo, danças um tango !




Público
Absolutamente fantástico, nada mais a dizer. De todas as nacionalidades, de todas as cores, uma festa estampada em todos os rostos. E por falar em rostos, vou já meter-me num avião para o Leste – as checas, as russas e as croatas foram de encher o olho e chorar por mais. Mulheres bonitas e crianças num estádio de futebol dão ao jogo um encanto irresistível. Se fosse sempre assim até eu ia ao futebol...

Vais para casa tão cedo?

A Dinamarca é muito longe?

- Chá, café ou laranjada ?
- Há dúvidas?


Dois bons motivos para emigrar. Ah que saudades do Euro...



(Amanhã – notas de 100 euros)

Saber sofrer, saber sorrir ...

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