terça-feira, março 16

Santana Lopes e a matura idade

O excelentíssimo e jovial gestor Paulo Miraldo, com uns tenros 40 anos de idade, assina na edição do passado Sábado do “Público”, mais um canto laudatório à pré-candidatura do Dr. Santana Lopes à Presidência da República.
Sob o sugestivo título “Combate de gerações”, o confiante gestor, promete presença no Aeroporto, de lenço branco em punho e lágrima no canto do olho, acenando um adeus português às hordas de fanáticos que prometeram mudar de nacionalidade no dia em que o Dr. Santana Lopes franquear os portões do Palácio de Belém.
Será um dia radioso quando, no seu estilo galvanizante, Santana Lopes soprar “novo fôlego de auto-estima em Portugal”, ou refundar a Política como “angariadora de sonhos motivadores e como força catapultadora do ser português”, como escreve um também galvanizado Miraldo.
Por mim, dispenso ver catapultado o meu “ser português”, e passarei muito bem sem andar de mão estendida para angariar sonhos.
Este “eu” português reserva desde já um lugarzinho em económica num qualquer “voo charter” de expatriados com bilhete de ida sem e volta, admitindo até voar a baixo preço na Air Luxor sem apoio do Estado ou segurança privada.

De cânticos, prefiro os negros
Mas, enquanto esse dia tarda, para impaciência de muitos, gostaria apenas de tecer umas brevíssimas considerações sobre a tese, digamos, pueril, que sustenta o seu fervor santanista, e que também outros proeminentes esbirros da guarda pretoriana do Dr. Lopes têm espirrado - à míngua de ideias, projectos, ou um discurso articulado sobre o futuro de Portugal.
A tese é que o Dr. Lopes é o melhor candidato a Belém porque é um homem novo.
Outro antes de si, o talismã Homem de Mello, conhecido por emprestar a sua moedinha da sorte a presidentes de vitória certa, havia já justificado o seu apoio “oracular” ao putativo candidato, com base na certidão de nascimento do Dr. Lopes.
Sangue novo na política, uma ruptura com o passado e frases gongóricas ao estilo do melhor western-spaghetti como: “Zé Manel estava escrito nas estrelas que nos encontraríamos”, são então a receita para erguer uma espécie de ETAR em Belém e tratar as águas pardacentas de Portugal.
Há falta de substância, as grandes valências do Dr. Lopes para ocupar o nosso máximo orgão de soberania são: ambição, eloquência, mediatismo e ... a idade !
Não querendo estender-me sobre os vastos recursos pessoais, profissionais e políticos do Dr. Lopes, tão prolixamente analisados por companheiros de partido como Pacheco Pereira ou Marcelo Rebelo de Sousa, gostaria apenas de tentar ser iluminado por essa peregrina visão de que o Dr. Lopes representa algo de novo na política nacional, pelo simples facto de ter nascido depois do final da II Guerra Mundial.
Colocar a pré-candidatura do Dr. Lopes no plano do “combate de gerações” é uma manobra embusteira, que visa passar uma certidão de óbito político a toda a gerontocracia dominante, ou seja, políticos com mais de 50 anos de idade que se perpetuam entre os folhos perfumados do poder, como os camaradas de Brejnev no Comité Central faziam na velha URSS.
Segundo entendi, a “Glasnost” à Pêpêdê é colocar o ideal de um “homem novo” como o Dr. Lopes na corrida para Belém, dando oportunidade a toda uma geração “nascida com o 25 de Abril” de se rever na política.
Acredito que sim, acredito que a desmedida ambição, o gosto pela conspiração e pela politiquice, a vertigem do sucesso, a avidez da fama, a cupidez do poder, o oportunismo galopante e a irreprimível vaidade; sejam valores de referência para uma parte da “geração nascida com o 25 de Abril”, mas mesmo para isso, também há para aí outros políticos a completarem a “job description”.
Em Gaia, por exemplo, mora mais um exemplar desta classe, curiosamente, apoiante confesso e defensor abnegado da “honra” do Dr. Lopes.
O que ressalta de mais patético desta tese do “elixir da eterna juventude”, é que o Dr. Lopes nem sequer é um homem novo.
Tem 48 anos, e quando mandar redecorar o Palácio de Belém para fazer capa na “Caras” já terá dobrado o terrível Cabo das Tormentas dos 50 anos de idade.
Prometi mim mesmo não me alongar sobre aparências, mas quando se fala do Dr. Lopes a tentação é irresistível, porque estamos no epicentro das aparências, e foram os seus acólitos, os primeiros a tergiversar sobre a “juventude” do candidato.
Ora, por mais que repuxe o fio capilar a brilhantina e gel, no melhor estilo Berlusconi-galã-de-estância-transalpina, o Dr. Lopes não deixa de ser um homem já “entradote”, produto de uma certa galante geração, que foi animada por uma espécie de síndrome tardia de Peter Pan, cuja sintomatologia se resume muito friamente como a “crise da meia idade”.
Há uns que a curam, comprando automóveis descapotáveis, há outros que querem ser presidentes da república; estes últimos inscrevem-se na categoria dos megalómanos perigosos.
Com quase 50 anos, o Dr. Lopes está por isso longe de ser uma jovem esperança da política portuguesa, onde aliás está envolvido profissionalmente há quase trinta anos, ocupando alguns cargos de irresponsabilidade que não lhe permitem, nem aos seus serventuários, desmarcá-lo do tal caquético sistema político, de que defendem ser ele arcanjo vingador.
O Dr. Lopes faz parte da mais velha e antiga família da política – a dos populistas -, e a única frescura que pode emprestar à vida política nacional é a sua infantilização.
O resto é mais velho do que a Sé de Braga, é a caduquice do costume a patrocinar a crendice costumeira.
Como dizia no outro dia um camionista “Portugal é mesmo assim”, e não consta que vá mudar, apesar destes arautos de voz melífula prontos a cantar “novos amanhãs”.
Por mim, prefiro os Cânticos Negros... Desengane-se pois o senhor Miraldo quando convoca sob a sua bandeira “esta geração nascida com o 25 de Abril sabe o quer e para onde quer ir. (...) Vamos ter em Belém alguém da nossa geração”.
Pela parte que me toca, não sei o quero e não sei por onde vou... mas sei que não vou por aí.


PS: No aeroporto, marcamos encontro nas partidas ou nas chegadas?

Rui Pelejão, 30 anos, futuro apátrida

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