domingo, janeiro 4

Derby da miséria ou Estado hipnótico da Nação

Também podemos falar de futebol, aliás, neste País parece que o futebol é um assunto de Estado, pelo menos do Estado cá do sítio.
Tudo a propósito do grande derby da segunda circular, que ocupou todo o fim-de-semana informativo como se fosse uma colónia de ácaras ocupa uma alcatifa pouco higiénica. Uma grande fanfarra mediática, grupos de amigos a organizarem petiscadas caseiras, e um resto de País domingueiro acotovelando-se na bejeca e tremoço do tasco comunitário que se diponha a pagar a tença aos manos Oliveira e à SportTv. Um país suspenso de um jogo de futebol, de um Benfica-Sporting, que por momentos eclipsa as poucas-vergonhas da Casa Pia, da Justiça e dos politiqueiros, o futebol que parece assinar um armistício informativo no Iraque, onde os americanos continuam a tombar no vespeiro que eles próprios atiçaram, um País suspenso no "pathos" relvado, onde tal qual a tragédia grega, são expiados os males e as frustrações de uma nação pródiga na auto-comiseração. E tudo para quê?
Para assistir a uma hora e meia de um jogo a que dificilmente se podia chamar futebol. Uma miséria franciscana que é o retrato fiel de um País que veste dez fatos de gala com assinatura de estilistas/arquitectos e que custam milhões, mas que não disfarça a peúga rota a fugir para o chinelo, que é traço perene desta nova portugalidade. E tudo isto para quê - para ser palco de uma deplorável e indecorosa imitação daquilo que deve ser um jogo de futebol. Independentemente do resultado do derby - de inteira justiça, apesar do penalty roubado logo a abrir - o que sobressaiu foi o futebol terceiro-mundista que temos. A qualidade sofrível dos intérpretes pagos como magos de bola que não são - são um conjunto de fraudulentos talentos, sustentados e promovidos por uma indústria de media e de espectáculo que cria essa hipnose colectiva a que todos prestamos veneração, independentemente da consciência de estarmos permanentemente a ser defraudados nas expectativas.
Neste Benfica-Sporting, apenas as cores das camisolas e o ambiente escaldante de uma catedral erguida para pedintes iludiu aquilo que se passou dentro das quatro linhas - um jogo dos distritais, com pancadaria de meia-noite, entradas assassinas e "birras" de meninos-grunhos-riquissimos de mais que duvidosa fibra moral e humana. Na Catedral da Luz - com a honrosa excepção de alguns poucos verdadeiros jogadores de futebol (Barbosa, Ricardo, Liedson, apesar de tudo Tiago e Nuno Gomes), tudo o que nos foi dado a ver foi a imagem fiel e não hipnótica da qualidade intrínseca do nosso futebol, que bem feitas as contas é um espelho fiel de um país trafulha, adepto da ronha, da fuçanguice e do fiteirismo, que são traços identitários do lusitanismo de pacotilha. As pisadelas de Petit, os empurrões de Miguel e Rochemback, as cotoveladas de Beto, os agarrões de Simão, as idas à piscina de João Pinto, são apenas comportamentos desportivos de má índole que podemos encontrar encapotados noutras corteses formas, todos os dias e em todos os lugares deste país de percevejos engomados. Com toda a justiça, merece Portugal o futebol que tem. Merecer os grandiosos estádios cheios de mosquedo que vai ter para prolongar o estado hipnótico colectivo. E, sobretudo merece o Presidente da República que vai ter, o mesmo que descerrou a placa comemorativa do primeiro Derby no estádio da Luz. O benfica paga uma dívida de gratidão a presidente-lagarto, tendo os vendilhões do templo o descaramento de ter uma placa na Luz com o nome do Dr. Pedro Santana Lopes - o futuro presidente de todos os portugueses, porque afinal a grande maioria de todos os portugueses também merecem um País assim. A hipnose continua dentro de momentos. Viva o Benfica! Viva o Futebol! Viva Portugal

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