sexta-feira, novembro 14

A Ilha do Fundão

E o barco vai de partida, adeus ó Cais d`Alfama que agora vou de fugida. Levo-te comigo ó cana verde, levo-te comigo ó meu amor, levo-te comigo nesta aventura para lá da aventura, para lá do Equador.
Fausto



Navegar, navegar, nos dias cinzentos de Novembro, procuro porto de abrigo dos mares revoltos da Internet, e avisto Terra Firme no fundo do monóculo que prescruta o horizonte.
Nas terras de Vera Cruz, à margem de Niteroi avisto a magnífica Ilha do Fundão, que se espraia no baixo ventre brasileiro, prometendo um sortido de delícias tropicais e o cafoné tropicaliente das esbeltas nativas.
Finalmente, alumia-se de lamparina o meu espírito imerso nas trevas, a propósito do regime de incentivo à fixação de jovens no Concelho do Fundão, que a benemérita edilidade local, hasteia como bandeira “repovoadora”, à laia de um D.Sancho demográfico, e de que faz gáudio e fanfarra no site oficial da Câmara Municipal do Fundão.
Preparado para embalar a trouxa e zarpar rumo ao interior granítico das beiras à beira da cova, sob a promessa dos chorudos descontos fiscais que enrobusteceriam o meu orçamento para os copos, espantei-me com a miragem que a foto seguinte documenta, e que é no site, o cartaz-isco para atrair a malta da Damaia e da Reboleira, para as covas da Beira.

Já com apetites despertos por uma campanha anterior para uma pândega de cerejas à farta, vejo agora uma esplêndida loura de porte frondoso, estender um decote com promessas de enlevos de fim de tarde ao som do rumorejar do mar Atlântico e do tilintar das flutes de “champagne” em “pas de deux”.
Primeiramente pensei que seria um caso claro de publicidade enganosa-, promover os encantos da vida no Interior, com um casal de banhistas em fundo de mar atlântico - ou dando desconto do benefício da dúvida, que o cenário do “set” seria alguma praia fluvial do Zêzere, despoluída por obra e graça do Espírito Santo.
Afinal não, quando nos mares revoltos da Internet descobri a Ilha do Fundão a jusante da costa onde o distinto cidadão de Belmonte foi desaguar aos enganos, percebi que a visão estratégica da edilidade e dos nossos autarcas transcende em muito a vulgar engenharia do dízimo.
No sentido mais metafórico do real, o Fundão é uma ilha, isolada pelos mares do esquecimento, da negligência, da ignorância.
O que faltava era entender as possibilidades semânticas dessa Ilha. Em vez de promovermos os pedregulhos, os cabeços, o toró de rachar das noites invernosas, ou o tintól hibernoso das tascas, a CM do Fundão pretende adoptar o modelo de ilha tropical, estando já em estudo uma série de medidas que prometem tornar a Ilha do Fundão, um verdadeiro oásis de prazer, onde apetece viver.
Em primeiro lugar, praias artificiais seguindo o modelo japonês, com areia de esferovite e água directamente do cano do Projecto de Regadio da Cova da Beira, que na data da sua conclusão servirá para banhocas, banhistas e campos de golfe, já que a agricultura é coisa moribunda e a enchada e o sacho não são passíveis de atrair as manápulas aveludadas das hordas de jovens da cidade que esgotarão a lotação dos ultra-rápidos TGV`s rumo ao Fundão.
Em segundo lugar, renovar a floresta e as espécies arbóreas, introduzindo o Coqueiro, a Palmeira e o Kiwi como espécies endógenas predominantes, extinguindo o pinheiro, o castanheiro e todas as árvores de fruta, incompatíveis com o clima tropical da Ilha do Fundão.
Em relação ao clima, encomendar ao MIT de Massachussets um microclima, capaz de reproduzir o fenómeno do aquecimento global, mas agora à escala local – No Fundão temos um aquecimento local; podia bem ser um dos slogans publicitários a adoptar.
A Rua da Cal seria transformada numa Rua de Bares de temas marítimos, ao melhor estilo de Albufeira, com nomes como “Tsunami”, “Mar Aberto”, “A Ilha dos Amores”, “Capitão Igloo”, “Discoteca”, “English Bar”, “O jovem lobo do Mar”.
Na arquitectura local pontificariam grandes mamarrachos com condóminos desenhados pelo Taveira, com o foclore cromático que lhe é habitual. Na gastronomia seroam banidos os enchidos e os maranhos, para adoptar a “fast-food” e a cozinha etno-globalizante. Finalmente, seria liberalizado o jogo do chinquilho e a suecada, a prostituição, a droga, bem como isentas as empresas multinacionais de pagar impostos, estabelecendo assim uma verdadeira concorrência desleal à ilhas Caimão, bem nas fraldas de Portugal.
Seremos portanto uma Ilha, e honradamente ilhéus, com sorte inaudita, as ruas vão parecer Miami com Pin UP`s a patinar ao fim da tarde, enquanto nós gozamos as delícias de uma 7-Up cruzada com cerveja importada e atiramos cascas de tremoços ao Mar que rodeia essa grande Ilha do Fundão. Em vez de beirões, seremos ilhéus, cortejados na nossa insularidade por quinhão grosso do Orçamento de Estado. Ainda há esperança para o Fundão.
Deo Gracias pelos visionários que comandam esta barca, porque ao leme vai mais do que um homem. Vai uma nação.
O único problema é que eu enjoo em mar alto, por isso fico para aqui enterrado.

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